Ver slides.
Nos slides que tenho visto, as roupas das pessoas são diferentes; os penteados; a quantidade de cabelo; os sorrisos. Nos slides que tenho visto há sítios onde nunca estive e nunca estarei; gente viva que já morreu
(a minha tia-avó, o meu pai, a Bia, a minha avó materna)
e bichos vivos que já não existem
(o Samba, o Leão, vários gatos)
e de que sinto falta. Há o meu tio. O meu tio está magro, tem uma barba muito escura e os olhos felizes. Há a minha mãe tão nova e tão bonita e eu tão parecido com ela do nariz para cima que impressiona. A Andreia miúda, agora casada e com um filho. Eu corado, com caracóis tremendos. E as casas. A disposição, de que mal me recordo, dos móveis e dos quadros e do resto nos espaços; as substituições
(anuais, mensais)
quase indetectáveis de umas coisas por outras. De umas pessoas por outras. Namoradas, amigos, conhecidos, gente chegada. E o que acompanha tudo isto: histórias de sopas comidas com filmes do Chaplin a passarem no "casão"; de um João que pedia
- Vamos perder-nos!
ao tio, quando davam voltas de carro.
Os slides que tenho visto lembram-me de que os meus foram felizes, têm sido felizes, são felizes e de que viveram, têm vivido, vivem. E lembram-me de uma outra coisa que colo constantemente como um post-it na minha cabeça: gosto de ver os slides dos outros, mas tenho uma vontade enorme de tirar os meus próprios slides.
Nos dias que correm, é por isso que me esforço - por uma "recolha de material", que tem sido óptima, para que, mais tarde, alguém veja as fotografias que tirei e se lembre, ainda que vagamente, de mim. De que fui feliz. De que vivi e estive vivo. E a par disto a circunstância tripartida: onde, com quem, quando.
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