quarta-feira, outubro 12, 2005

Ficção (9).

Deste por ti na cama, de olhos no tecto, a fazer uma contagem decrescente

(cinquenta e nove, cinquenta e oito, cinquenta e sete)

porque não conseguias dormir e pensaste que, contando de trás para a frente, talvez o sono chegasse, talvez

(cinquenta e seis, cinquenta e cinco, cinquenta e quatro)

a memória dele desaparecesse; que talvez pudesses ter uma noite de sono sem recorreres aos já tão habituais Dormicums. Como sempre te enervou ficar na cama quando não consegues dormir,

(cinquenta e três, cinquenta e dois)

levantas-te, abres a porta do teu andar (o último do prédio em que vives) e sentas-te na escada, em pijama, a olhar para um céu contido numa clarabóia suja;

(cinquenta e um, cinquenta, quarenta e nove)

até que te esqueces de contar

( )

e adormeces, encostada de leve à parede.