terça-feira, setembro 23, 2008

Lá fora.

Saio da tua casa é meia-noite. Levanto a mão direita e digo-te até amanhã. Encosto-me a um dos lados do elevador, corro os losangos de madeira e metal; desço. Chego à entrada do teu prédio, abro a porta, saio. Na rua nada. É Domingo. Consigo ouvir os meus passos no chão e vejo a minha sombra projectada à direita, nas fachadas dos prédios por que vou passando. O meu andar irregular, arrítmico. Pouco depois estou em casa; ninguém cá. Rodo a chave para a direita quatro vezes e dou-lhe uma meia-volta para entrar. Acendo a luz da entrada, descalço os sapatos, vou até à sala e acendo outra luz; outra na sala ao lado dessa; outra no quarto. Arrumo os sapatos aos pés da cama, volto à sala, ligo a televisão. Quando dou por mim são quatro da manhã. Nos andares acima do meu nenhum som; no meu apenas o murmurar eléctrico das lâmpadas e da televisão a que baixei o volume, para que vê-la se torne um acto divinatório. Talvez faça café daqui a pouco; talvez chá. É provável que passe a noite em branco, a ler ou a ouvir música; a reparar nos barulhos que - lá fora e mais tarde - começam a encher as traseiras do prédio, voltadas para outras traseiras de outros prédios desta rua e da rua atrás desta: o som de loiça a ser tirada dos armários para o pequeno-almoço, janelas que se abrem, estores que se enrolam neles mesmos, um cão a ladrar numa varanda, o estalo de uma toalha que alguém sacode.