Ficção (61).
Naquela noite esperei-te e não chegaste. Tu sabes como sou com as esperas: andei de um lado para o outro; sentava-me, levantava-me, tornava a sentar-me. E o telefone quedo no descanso; a campainha muda por cima da porta. Perdi a conta às horas e às vezes em que disse para mim
- Vou contar até dez e tu chegas
ou, enquanto me assomava à janela da sala,
- O próximo carro branco é o teu.
Passaram carros brancos atrás de carros brancos: nenhum o teu. Houve um momento em que pensei até que o teu carro não fosse branco, ou que tivesse desaprendido a contar. Nessa noite em que não vieste, sentei-me de pernas cruzadas no chão frio da varanda, ao lado dos vasos de alfazema: lá em cima, no tecido estranho do escuro, pontos brancos inconstantes, mais e menos intensos, maiores e mais pequenos. À medida que as horas passaram e o vácuo do teu corpo ficou por preencher, apercebi-me de que não tornarias à casa onde há quinze anos tínhamos entrado pela primeira vez.
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