Filme-cicatriz.
Às 21h50min de Sábado, entrei para a sala 5 dos cinemas Monumental Saldanha Residence, para ver A Home at the End of the World - um filme de Michael Mayer e com argumento adaptado por Michael Cunningham a partir do seu romance homónimo. Se há filmes que nos fazem tremer as bases, este é, sem dúvida, um deles. Mais do que isso. Muito, muito mais. Não é um filme - é um monumento. A sério que gostava de conseguir falar dele; de ser capaz de citar momentos favoritos, frases que me ficaram, de descrever cenas com precisão rigorosa. Tudo isso.
Mas não consigo.
E não consigo porque sinto o coração pontapeado; não consigo porque foi um filme que me apanhou desprevenido e que deixou, atrás de si, um rasto de destruição. Noventa e seis minutos de uma coisa tão incrivelmente avassaladora que ficamos sem palavras para a descrever. Que damos por nós, horas depois, em pé, na cozinha, a beber um copo de água quase gelada na esperança de que o choro profundo, soluçado, acabe por parar. Mas depois vêm as imagens. E as frases. E as cenas que não conseguimos deixar de revisitar. Desde aquele choro inicial tão violento àquela dança no alpendre da casa; desde aquele beijo ao som de Mozart, no telhado de um prédio de Nova Iorque, ao momento em que as cinzas se dissolvem espalhadas no vento, no meio da neve. E aquele adormecer rápido, instantâneo, descansado, que só acontece porque uma das personagens está perto de outra que ama e sempre amou. Tudo. Tudo tatuado na memória. Tudo a surgir irreversivelmente.
E sabemos - sabemos porque o sentimos na pele arrepiada, na cara ainda húmida, nas mãos que fazem força uma contra a outra para tentar conter o soluçar que insiste em irromper - que é um filme que nos vai ficar como uma cicatriz fica.
(Indelével. Permanente.)
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