O tempo verbal não é inócuo.
Ando assombrado pelo álbum do Jarvis Cocker, mais especificamente por uma música que tem como título "From Auschwitz to Ipswich", da qual gostava de destacar algumas partes. Não o faço porque enfiar
(e o verbo também não é inócuo)
mensagens nas entrelinhas é coisa que, nos últimos meses, começo a não ser capaz de fazer. Como tal, fico-me pelo óbvio: são três e onze da manhã quando escrevo isto; estou a beber a enésima chávena de chá do dia e tive, durante um bom bocado da noite, as mãos francamente frias; não consigo parar de revisitar o momento do Lost in Translation em que, a meio da noite, aparece aquela pergunta tremenda
("Are you awake?")
e desejo, muito secretamente, que ma façam seja por que via for - ou ainda a observação que o marido da Charlotte lhe faz
("Why do you have to point out how stupid everyone is all the time?")
e que me dá vontade de encolher os ombros. E depois disto tudo o resto. O não conseguir dormir, por exemplo: vou para a cama às duas da manhã e só consigo adormecer às seis; acordo cansado. Descobri, apesar de tudo, que adormeço facilmente no sofá da sala, com a televisão a murmurar-me coisas que não oiço realmente e com o aquecedor a manter-me o frio longe dos ossos. Tenho tido como banda sonora de alguns momentos do meu dia o Ba Ba Ti Ki Di Do, dos Sigur Rós. Fiz anos na terça-feira e o dia foi bom. Comecei a comprar chá na casa em que a minha avó o comprava. Constatei a morte por negligência de uma amizade de onze anos. Passei por sítios. Vi gente e carros e árvores e prédios e cães com ar simpático e senti-me vivo. Acenei ao longe à igreja por que passava quando era pequeno. Lambi dos móveis o pó.
Estou vivo. Sinto-me vivo. Faço planos.
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