Ficção (51).
Todos os dias faço um bailado estranho em que tu não entras e eu só às vezes. Não há movimento inicial - apenas um começo sacudido a meio: quando me debruço sobre a bancada e esbracejo ou quando faço sapateado de costas coladas à parede; quando dobro a roupa, lavo o chão ou finjo importar-me com o si bemol da tua voz. O bailado que faço não é bonito nem feio mas é útil para me manter à tona. E há dias em que me permito o arrojo de um plié cafeinado com a cara molhada e a boca seca. Não me digas que me queres ver dançar porque não queres. Caso queiras, ficas a saber que não há bilhetes: que o espectáculo esgotou quando ainda estava na minha cabeça, de onde nunca chegou a sair.
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