The big chill.
Dou muito valor aos poucos amigos que tenho. Não sou uma pessoa que os faça com facilidade, diga-se, ou que lide bem com a perda de um. Fiz o meu primeiro amigo com seis ou sete anos. Estava na primeira classe e era o primeiro ou o segundo dia de aulas. No intervalo, aproximei-me de um rapaz da minha turma e disse-lhe
- Queres ser meu amigo?
e ele nem hesitou e respondeu
- Sim.
Ainda hoje consigo localizar o sítio exacto daquele recreio onde trocámos estas palavras. Não sei ao certo o que ditou que o tivesse escolhido a ele e não a outra pessoa da minha turma de vinte e tal outras crianças; nem sei por que razão ele me disse que sim quando lhe fiz aquela pergunta. Mas ficámos amigos até ao dia em que, oito anos mais tarde, pusemos um fim tácito ao que até aí nos unira. Entretanto perdi uma amiga de doze anos e outra amiga de três; voltei a falar e a dar-me com um amigo que julgava perdido; conheci gente de quem gostei e que, surpresa das surpresas, gostou de me conhecer - gente de quem fui ficando próximo aos poucos; aproximei-me mais de pessoas que já me eram chegadas. Pelas minhas contas, há muito tempo que não pergunto a alguém, sem quaisquer rodeios, se quer ser meu amigo - tenho tido a sorte de esbarrar com pessoas que gostaram de esbarrar comigo, e que foram ficando. Talvez agora - depois de vinte e dois anos e de alguns bons amigos perdidos e outros tantos ganhos - a pergunta já não faça sentido.
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