quinta-feira, novembro 12, 2009

Pó.

Fino, branco e absoluto: assim é o pó desta casa - um pó que se espalha do tecto ao chão, que se cola também às paredes, aos vidros das portas, aos pulmões. Os caminhos que trilhamos estão hoje transcritos por ele. Há o trajecto mais gasto - entre quarto, cozinha e quarto -, que devolve ao soalho a sua cor original; um outro não tão usado - quarto, piano, quarto; há a impressão exacta da sola de cada sapato, às vezes esborratada por uma mudança de curso imprevista ou mais súbita. Daqui a dias, tudo limpo. Não restará quase indício de ter havido aqui em casa um pó bravio, que tomava território sem aviso. Até que, anos mais tarde, a lapiseira amarela desliza para debaixo da estante; quando metemos a mão a buscá-la, vem branca - envolta num manto ténue daquele pó que, escondido, ali ficou.