Parcelas parciais.
Com o passar do tempo, o coração hipoteca partes.
"So that I may say at all times, even when you do not answer and perhaps hear nothing, something of this is being heard, I am not merely talking to myself [...]." (Samuel Beckett, Happy Days)
O vento atravessa a casa, derruba-me umas quantas folhas.
Não digo como o outro: sei que não sei nada
Tenho o portátil em cima da mesa da sala e estou a escrever com as janelas que dão para o pátio das traseiras do prédio abertas. Os canteiros cheios de plantas. As buganvílias cujas cores preenchem toda uma parede e um pedaço de outra. E a mesa sobre a qual o tempo tem passado, rachada e enferrujada em juntas ocultas. Hoje acordei cedo.
Parte da tarde / noite de ontem foi passada a configurar o novo router wireless cá de casa. Depois de alguns meses a ameaçar
Sobre os cabelos brancos a que sorrio sabendo que os tenho agora. Numa fila de carros que partem rumo ao sul. Da boca imóvel isto. Vou ser uma criatura exótica e difícil de apanhar. Com cachecóis vários que prendo com um alfinete complexo e cintilante. Velho-maravilha sem ser velho. Vou dançar todas as noites, girar sobre mim mesmo enquanto grito obscenidades letradas e inaudíveis. Vou sentar-me à mesa e dizer que quero café e chá. Deitar-me tarde. Não dormir. Comer o mundo. Ser fanfarrão quanto baste, aviar receitas de substâncias ferozes que não tomo e que procuram dar-me o sono que me foge. Rir-me como se chorasse. Pintar quadros complicados.
No My Life without Me, a Ann diz, a dado momento, que ninguém pensa na morte nos supermercados. Não sei se é verdade, mas sinto-me tentado a concordar. Faço as compras semanais à sexta-feira à tarde, num hipermercado que nem fica muito perto da minha casa mas no qual me sinto completamente à vontade. Acho que há coisa de um ano escrevi um ou dois textos sobre "fazer as compras". Se mantenho muito do que disse, há aspectos que se calhar modificava. É que acho piada a andar pelos corredores e ver o que há de novo; a organizar no carrinho