quinta-feira, julho 29, 2004

Tríptico: 2.


Tríptico: 3.


Tríptico: 1.


quinta-feira, julho 22, 2004

Nota mais-que-breve.

Adoro café frio, ao som do No. 6 ('Bryllupsdag pa Troldhaugen'), Op. 68, de Edvard Grieg, interpretado por Leif Ove Andsnes.


Apologia do trabalho.

O trabalho afasta qualquer pensamento mais negro, qualquer réstia de tormenta. O cheiro do Sonasol Amoniacal; o suor que cai enquanto esfregamos banheira, lavatórios, sanitas, chãos; os músculos já tremelicantes do esforço - não há desgosto amoroso (ou recordação deste) que resista, descobri-o hoje. Afastem de mim psicólogos, conversas de base catártica ou choros saudosos: passem-me para a mão os detergentes, o balde, a esfregona, que eu dou cabo das mais resistentes lamúrias - eu ocupo-me 'disso'.

Quando cair exausto, nada haverá para chorar - tudo terá sido esquecido.

(Tais são as virtudes do trabalho.)

quarta-feira, julho 21, 2004

Ref. 1003/b: amor, perda e plantas.

Venus, afloat on swansdown in the high blue,
Still far short of Paphos, felt the shock-wave
Of the death-agony of Adonis.

She banked and diving steeply down through cirrus
Sighted her darling boy where he sprawled
Wallowing in a mire of gluey scarlet.

She lept to the earth, ripping her garment open.
She clawed her hair and gouged her breasts with her nails,
Pressing her wounds to his wounds as she clasped him

And screaming at the Fates: 'You hags shall not
Have it all your way. O Adonis,
Your monument shall stand as long as the sun.

'The circling year itself shall be your mourner.
Your blood shall bloom immortal in a flower.
Persephone preserved a girl's life

'And fragrance in pale mint. I shall not do less.'
Into the broken Adonis she now dripped nectar.
His blood began to seethe - as bubbles thickly

Bulge out of hot mud. Within the hour
Where he had lain a flower stood - bright-blooded
As those beads packed in the hard rind

Of a pomegranate. This flower's life is brief.
Its petals cling so weakly, so ready to fall
Under the first light wind that kisses it,

We call it 'windflower'.


[ Ted Hughes: Tales from Ovid, 'Venus and Adonis (and Atalanta)'. ]


domingo, julho 18, 2004

O ataque dos 'nhónhís'.

Nas minhas incursões domingueiras pelo maravilhoso mundo da TV Cabo, acabo por ir sempre parar (já dizia o outro, 'same Bat-time, same Bat-channel') a um programa maravilhoso chamado 'Querido, mudei a casa!' - não sei se tem vírgula ou não, mas achei por bem pespegá-la. Ora, dizia eu, da observação que tenho feito do simpático programa, tenho vindo a extrair algumas conclusões que, não sendo propriamente impressionantes, não deixam de ser relativamente engraçadas. Entre estas conta-se a seguinte: as casas que vão ao 'Querido, mudei a casa!' não precisam de ser mudadas. Confuso? Eu explico: não há reparações a fazer, as remodelações feitas são mínimas e, constatação das constatações, as pessoas escolhidas para participar são sempre (e os adjectivos seguintes, à excepção do último, não existem 'na natureza'): a) betíssimas, b) benzézimas e c) extraordinariamente irritantes. Vamos lá fazer a soma das partes - não havendo necessidade de remodelações nas divisões escolhidas para o programa, não havendo propriamente grandes entraves financeiros da parte de quem é escolhido (e é de salientar que, como nos diz a ex-TVI Sofia Carvalho, todos os objectos usados na decoração da divisão, assim como o trabalho dos técnicos, são oferta do programa), por que raio é que o programa se chama 'Querido, mudei a casa!', hum?

A solução está já ali à esquina - mudança de nome do programa (com efeito imediato) para uma das três propostas seguintes:

1. 'Tia, mudei a casa - agora, me beije, boba!';
2. 'Querido, mudei a casa que não precisava de ser mudada...';
3. 'Bernardo, quero uma sala nova: concorra lá àquele p'ograma!'.

Para a semana, se não remodelarem um T6 na Lapa, deixo de ver.

Tenho dito.

sábado, julho 17, 2004

Nullus reditus.

Sobes as escadas a correr e estacas quando chegas à minha porta. Bates com força. Acordas-me. Levanto-me estremunhado e pergunto quem é, ao que me respondes que és tu. Entreabro a porta e pergunto-te secamente o que queres. E tu dizes-me que não devias ter feito o que fizeste, que me querias pedir desculpa o mais cedo que pudesses - não importa se são quatro da manhã -, que não consegues dormir há dias. O silêncio é a minha resposta. Não se ouve nada além do barulho seco da corrente de ar no interior do prédio. Digo-te que deixaste a porta aberta. E tu dizes-me para me ir lixar e perguntas-me se não sinto nada, se acho que não tens coração - que isto não te está a doer. Não respondo. Perguntas-me se podes entrar. Digo-te que não, que isto tem que parar, que me recuso a ser porto de abrigo ou o caraças; que estou farto; que me cansei. Digo-te boa noite e fecho a porta. Dizes-me por favor e eu repito: boa noite.
 
Quatro voltas da chave depois, a porta está fechada. Fico colado a ela, do lado de dentro, a ouvir-te respirar. Sentas-te no chão, na esperança quase vazia de que eu ceda - como tantas vezes aconteceu. Do lado de dentro, consigo ver a luz da escada do prédio a apagar-se. Levantas-te, olhas para a porta (sei-o porque te vejo fazê-lo, de dentro do andar), suspiras e viras costas. Desces as escadas com a luz por acender e fechas, por fim, a porta do prédio que tinhas deixado aberta.
 
Volto para a cama. Abraço-me às almofadas que substituíram o vazio do teu corpo. E tento dormir, com os olhos postos na luz que me entra filtrada pelo estore da janela do quarto.
 
(Dormir, para variar.)
 


sexta-feira, julho 16, 2004

Explanation not included.

Cansado, arrasto-me da porta de entrada (agora fechada) até à cama e caio. A cara molhada. Não sei em que penso. Sei que caio. Não sinto o embate do meu corpo no colchão. Lembro-me das palavras de Hanif Kureishi em Intimacy - 'The highlight of my day is the anticipation of unconsciousness.'
 
Olho para a janela. Deixo cair as pálpebras e adormeço.
 

Chá: sem café ou laranjada.

Desligo a luz da cozinha. Sigo pelo corredor. Entro no quarto. Sento-me na cama. Bocejo. Pego na chávena e o calor que sinto nas mãos adormece-me. Esqueço-me do cansaço, de eventuais 'descargas biliares' no decurso do dia, e deixo-me estar - com a chávena de chá entre as mãos e a deixar-me dormir. 
 


Efeméride.

Way Down

Maybe I'm the afterglow
'cause I'm with a band you know
don't you hear the laughter on the way down

Yes I am the anchorman
dining here with Son of Sam
a hair too much to chat of on the way down

Gonna meet a great big star
gonna drive his great big car
gonna have it all here on the way down

the way down
the way down
she knows
let's go
way down
way down
the way down
she knows


[ Tori Amos: Boys for Pele. ]

quarta-feira, julho 14, 2004

A chuva, o vidro ou outra coisa qualquer.

Na casa em que vivi antes de me mudar para esta, costumava tirar fotografias aos vidros, quando chovia. Nunca percebi ao certo o que estava a fotografar: se a chuva, se o vidro, se o que estava lá fora. Nunca percebi. Mas, se tivesse que 'apostar', 'apostava' noutra coisa qualquer.


Clarabóia.

Abrir a porta do andar e sair - de pés quase descalços - para o patamar. Olhar para cima.


Soalho.

O chão do meu quarto. A textura do chão do meu quarto. O cheiro a madeira. A cor da madeira. A luz que passa através do estore e que corta o soalho em tiras muito claras. Os meus pés no soalho.

Semi-photoblogging.

Acabei por sucumbir à tentação de fazer posts de / com imagens. Não consegui evitar. É uma verdade incontornável: uma imagem vale (por vezes, pelo menos) mais do que mil palavras. As fotografias colocadas neste blog, salvo indicação em contrário, são da minha autoria.

domingo, julho 11, 2004

Admissão de culpa e explicação.

Dormir não custa. Custa é acordar e adormecer sem o teu corpo ao meu lado, sem o peso do teu respirar na minha nuca. Sem ti.

(Só isso.)

Em cheio.

how can you think you've won
when there can be no winners


[ Tori Amos: Scarlet's Hidden Treasures, 'Apollo's Frock'. ]

sexta-feira, julho 09, 2004

Basta.

Depois de três horas de espera, há várias coisas que me parecem substancialmente mais claras. Destas, contudo, destaca-se uma: tenho que começar a ter noção de que a vida dos outros não 'depende' da minha. É um facto consumado - não oscila consoante a minha aceitação. Neste sentido, parece-me lógico acrescentar outra constatação-a-poder-de-carvão: a minha vida não pode 'depender' da dos outros. Não é hermética (a constatação). Não é obscura. Não é nada. Mas já cá devia ter chegado há muito. E é imperdoável não o ter feito.

Começa aqui o meu processo de independência (sem quaisquer aspas) - porque, sim, a independência é um processo. Lento. Entediante até à náusea. Mas, sobretudo, doloroso.

(Seja.)