Estou atrasado. De há coisa de um ano ou dois para cá, tornou-se habitual: perdi a pontualidade quase por completo. Saio no Rossio, e faço os dois minutos da Rua do Carmo a pé, em passo de corrida. Como não a vejo à primeira - e sou bastante mau a reconhecer caras, mesmo as conhecidas, no meio da multidão -, ligo-lhe. Dou com ela. Decidimos sair dos Armazéns do Chiado no momento exacto em que começa a chover uma daquelas chuvas incisivas de Abril. Entre gargalhadas, escolhemos à pressa ir ao Vertigo, onde passamos duas horas com um bule de chá branco aparentemente interminável em cima da mesa. A dado momento, por causa de um ataque de riso simultâneo, ela pergunta-me se as pessoas que ali estão pensarão que somos doidos ou só excêntricos. Respondo-lhe que, provavelmente, ambos. Tira-me uma fotografia. Há muito nestas duas horas que não se decalca na escrita: as
private jokes; aquela cumplicidade estúpida que só anos de convivência - no nosso caso, pelo menos vinte e dois - trazem; todo um repositório de episódios, passados e presentes, que, relembrados, fazem rir. Apesar do tempo contado, saímos deste café com o coração cheio. Caminhamos um pouco; dizemos até à próxima em frente ao Pereira. Esperamos que seja em breve.