Vizinhos mudam-se em simultâneo. Ao longo do corredor estreito, carregadores levam para os espaços cestos com roupa, móveis envoltos em mantas riscadas. Rapidamente se preenchem as divisões com os pertences, alguns trocados. Ela encosta-se à parede como hera e ali fica. Trocam sorrisos esforçados. Mais tarde poderão encontrar-se: é certo que o farão, evitando sempre replicar os gestos conjugais; marido e mulher, esses, figuras de corpo quase ausente.
O dia é outro, a noite outra. Prisioneiros no quarto, ele dorme, ela também. Esgota-se a coreografia paralela dos seus passos numa cidade que os esquece e torna esquecidos. É preciso mudar; é preciso partir e voltar depois aos sítios de sempre - esperando encontrar nos lugares costumeiros gente, mobília, afectos. Recordam-se às vezes: ele, do negro impoluto dos cabelos dela à medida que se afastava; ela, do quarto dele em que ele agora não está. Na casa onde mora, primeira e última de todas porque a mais feliz, chama o filho e preparam-se para sair. O passado fica no chão, nas paredes, nos cortinados, no pó fino em cima dos móveis - morto na pele.